La Paula está de luto
Reduto de jovens estudantes mourãoenses, entre os anos 80 e 90, o Bar La Paula, em Curitiba, está de luto. A sua maior estrela, a dona, Paula Biz, morreu aos 79 anos, vítima de Covid. Ela havia sido hospitalizada há duas semanas. Mas não suportou as complicações. Sempre de alma jovem, nasceu em Indaial, em Santa Catarina. Na vida, se mostrava uma mulher simples e sonhadora. Antes de chegar a Curitiba, trabalhou na roça.
Na chegada à capital paranaense, a família abriu o Chic Bar, na Praça Tiradentes. As atividades duraram até 1964. Depois disso, Paula montou uma pequena mercearia. Com o tempo, se transformou em lanchonete. E por fim, no La Paula. Em sua caminhada, jamais se casou. Teve dois filhos. Um deles morreu há seis anos, vítima de infarto. O outro, Beto, era o seu braço direito. “Hoje ela nos deixa. Mas a memória que fica dela é a de alegria e amor, de perseverança e trabalho duro. Que todos se inspirem na Dona Paula”, disse o filho.
La Paula
Final dos anos 80. Esquina das ruas Doutor Pedrosa e Lamenha Lins, no Batel, em Curitiba. Um grupo de jovens estudantes mourãoenses, nem sempre com um troco no bolso, adotou a lanchonete La Paula como seu ponto de encontro. Ali, a base do bom e do clássico Rock and Roll, cerca de 50 jovens deixaram parte de suas histórias. Conversas sobre política, música e, principalmente, reverenciando o humor, marcaram não só aquela esquina, como a dona do local: a eterna companheira Paula.
O La Paula começou a funcionar ainda em 1966. Paula e Vitor, seu irmão, tomaram a frente na década de 70. Sócios, eram os dois quem organizavam a bagunça dos mourãoenses. Na década de 90, Vitor morreu. Paula continuava, até poucos dias, com a ajuda de seu filho Beto. Além da cerveja gelada, o bar conta com salgados e lanches feitos na hora. Está localizado no coração de Curitiba e, uma ida até o local, certamente não será em vão. Mas na próxima semana. Nesta, o luto foi decretado.
Um tempo inesquecível
Despretensiosos quanto ao futuro, os mourãoenses faziam suas obrigações durante a semana – que era apenas estudar – e nos finais de semana invadiam o La Paula. Era lá onde um dos líderes da turma, Brande Perdoncini – em memória – já havia estacionado sua Parati preta. Com o porta malas aberto, permitia ecoarem solos de guitarras de Jethro Tull, Led Zepellin, Black Sabbath, Doors e Deep Purple. Pronto. Cadeiras na calçada, cerveja gelada e muita prosa pra fechar a tarde. Caixas de cerveja a serem pagas. Brande dizia que o bar era um pedaço de Campo Mourão na capital. “Teve um dia que fechamos a rua. Os curitibanos não entendiam o que acontecia”, disse ele, numa antiga entrevista.
O final dos anos 80 encerravam o ciclo de ouro do bom rock nacional. Mesmo assim, aquele grupo enfatizava o velho e clássico Rock and Roll. Até hoje muitos daqueles jovens curtem as bandas que saltavam do porta malas do carro de Brande. E parecia uma esquina de contradições. A velha Curitiba, emoldurada nos seus costumes retranqueiros, não entendia o que acontecia ali. Pensavam: Quem são esses loucos. Por que tanta alegria. Por que um som tão alto? Mas somente quem estava longe da família entendia a verdadeira relevância daquele grupo. Da música alta. E da alegria, que a todos contagiava.
Paula tinha sempre um ombro pra acolher. Conversava em particular com a galera. Se preocupava com as doses a mais. Com a convivência regular da turma, o fiado tornou-se inevitável. Mas no final todos honravam as contas.
Com o tempo a turma foi diminuindo. Afinal, quem se formava tomava seu rumo. Alguns voltaram pra Campo Mourão. Outros continuaram na capital. Os casamentos também contribuíram para a ausência no La Paula. Lá pelo ano de 1995, a turma mourãoense já havia se dispersado por completo. E o La Paula, apesar de continuar a servir, já notava a ausência da turma. A música tinha silenciado e as risadas já não eram mais as mesmas.
Mas agora, a ausência maior será de Paula. Ela foi sepultada na última segunda-feira. Numa cerimônia que não demorou mais de 15 minutos. A mulher batalhadora, que sempre encarou os obstáculos, perdeu a guerra à Covid. Naquela esquina, memórias e boas lembranças de uma empresária diferenciada. E de tempos, que definitivamente, não voltam mais.