Promotor de Justiça de Campo Mourão participa de produção de livro jurídico internacional
O Promotor de Justiça de Campo Mourão, Marcos Porto Soares foi destaque internacional ao publicar o capítulo “Como detectar e provar judicialmente uma mentira”, do livro ‘Prueba, Verdad, Razoniamento Probatorio”. A obra trata sobre formas de detecção de mentiras de pessoas envolvidas em crimes.
Porto comenta sobre sua participação na produção da obra internacional. “Foi uma sensação muito boa. Primeiro por acreditarem no meu trabalho, e segundo por poder transmitir para mais pessoas a minha pesquisa e pensamentos”, avaliou.
Segundo ele, o convite para escrever partiu em decorrência do mestrado que fez na Universidade de Girona, na Espanha. “Lá conheci o coordenador da obra que é o Daniel Psfil Flores e pude ter aulas com grandes juristas como Michelle Taruffo e Jordi Ferrer Beltrán”, informou.
Porto relata a sensação de ver a obra concluída. “Tem um impacto enorme na minha carreira acadêmica por poder contribuir de forma ampla para a construção do conhecimento científico jurídico”, descreveu.
Ele destacou ainda sobre o foco do estudo apresentado no livro. “São as provas dos fatos. No Direito quase sempre o enfoque são as normas jurídicas (o que diz a lei), mas tão ou mais importante é estudar como provar os fatos sobre quais as leis se aplicam. E o livro é sobre isto, prova, verdade e raciocínio probatório”, frisa.
Como promotor de Justiça, Porto diz que sempre buscou saber se uma pessoa estava dizendo a verdade ou não durante o julgamento. E, segundo ele, os estudos para o livro contribuíram ainda mais sobre as formas de identificação da mentira ou da verdade em um júri.
“Antes mesmo do convite para o livro, já pesquisava métodos de detecção de mentira, sendo um dos que mais me fascinava era o do Paul Ekman, que inspirou a série Lie to Me. Este método tem como base a análise das micro expressões faciais para identificar se a pessoa está inventando uma história ou falando o que realmente presenciou”, comentou
Durante os estudos, o promotor fala sobre os avanços no conhecimento sobre o tema. “Foi adquirido no mestrado, percebi que este método não permite imputar alguém uma mentira. Pesquisas identificaram que a margem de acerto dos policiais na detecção da verdade usando a análise corporal era de 54 % enquanto a média obtida por testes feitos em estudantes sem nenhum treinamento era de 56 %. Para ser usado e aceito como prova de mentira teriam os investigadores que adquirem uma habilidade extrema de análise corporal das pessoas, que exigiria muita expertise, que até hoje não é possível ter. A partir daí iniciei a pesquisa mais profunda que durou aproximadamente um ano, onde compreendi de que forma se pode eficazmente comprovar judicialmente quando uma pessoa está mentindo”, lembrou.
Porto comenta que a pergunta que muitas pessoas fazem é ‘como provar uma mentira em Juízo?’. Ele explica que para isso é necessário usar o método certo. “Nem todos são aceitos pela comunidade científica. Um dos primeiros e mais famosos a serem utilizados na justiça foi o polígrafo, que teve seu uso vedado já em 1923, no caso Frye vs EUA. Mais recentemente, outras técnicas surgiram, como a do RMf e o N400. Com o RMf é analisada a atividade cerebral da pessoa no momento da fala, e a mentira identificada com base em maior movimentação em determinada área do cérebro. Pelo N400, a pessoa é ligada a um aparelho e submetida a estímulos visuais ou auditivos, determinadas ondas surgem se ela alguma vez já viu aquele objeto ou lugar ou escutou aquele som. Mas tanto o RMf e N 400 possuem limites que os impedem de serem usados como prova de uma mentira”, informou.
Ainda conforme o promotor, não basta ‘só descobrir’ se uma pessoa está mentindo. A versão tem que ser estudada e fundamentada. “A mentira precisa ser constatada, demonstrada e justificada. É preciso explicar como se chegou a ela. Como justificar num processo judicial que a pessoa estava mentindo com base apenas na intuição do julgador ou da análise do corpo da testemunha? Racionalmente não há como. Qual maneira podemos provar judicialmente uma mentira? A resposta é bem simples, buscando incongruências ou falhas na explicação de quem está falando. A mentira é detectada e provada pela incoerência, pela contradição do que a pessoa fala com os dados existentes, e não com base no nervosismo, piscar de olhos, movimentos do corpo, pulsação sanguínea ou do cérebro do depoente. O método adequado é o contextual, pois ele é justificável”, afirmou, ao comentar que durante um depoimento em juízo, o método mais prático utilizado é o contextual.
“Estudiosos na área de investigação como Jaume Massip e Carmen Herrero apontam que a testemunha deve falar bem mais do que quem faz as perguntas. O investigador, seja ele juiz, promotor, delegado, deve transmitir poucos dados ao depoente, o deixando falar o máximo possível. As perguntas específicas devem ser feitas no final. E como mentir é mais difícil que dizer a verdade, é uma boa prática fazer questionamentos inesperados ou pedir para que conte a versão de trás para frente”, acrescentou.