Audiência pública sobre Santa Casa ajuda a acalmar crise entre prefeitura e hospital

Desligamento de médicos. Desativação de alas. Falta de pagamento a fornecedores. Déficit. Crise. Para debater a atual situação da Santa Casa de Campo Mourão, a Câmara Legislativa realizou na manhã de hoje, uma audiência pública com a participação da população e de autoridades ligadas à saúde. Com o auditório lotado, o vereador Márcio Berbet iniciou a sessão destacando que a audiência havia sido marcada antes mesmo da posse da atual diretoria e que, agora, o momento é de buscar soluções. E se, os ânimos estavam aflorados entre a nova diretoria e o município, o debate ajudou a construir as vias do bom diálogo.

Presidente da Santa Casa há 67 dias, Mariceli Bronoski revelou que, mesmo com pouco tempo de gestão, a direção já fez muitas descobertas. Vem travando batalhas e, ao mesmo tempo, alcançou avanços. “Nosso foco é salvar vidas. Estamos lá para isso. Trabalhar com eficiência. Desde que assumi escutei, vai pegar essa bomba? Como se a Santa Casa fosse a pior do Paraná. Como se fosse o caso de uma intervenção”, disse.

Diante de um quadro deficitário, seja por onde ande no hospital, Bronoski está certa que a instituição tenha saídas. A começar com um plano de estruturação, como o controle de entradas e custos. “Toda caixa preta pode ser aberta. Não temos medo. Agora é uma nova história da Santa Casa. É o momento de resolver”, afirmou.

Dentre os problemas apontados ao entorno de uma dívida atual de R$57 milhões, Bronoski citou a falta de medicamentos e insumos, furos de escala, desligamento de médicos, falta de pagamento a fornecedores e tributos. Além disso, também observou setores essenciais desativados. “Em cada gaveta aberta tinha uma coisa”, disse.

O primeiro passo, segundo ela, foi identificar os “gargalos” por onde o dinheiro saía. “Identificamos salários de até 35 mil. Mas quando desligamos estes profissionais, fui questionada”, afirmou. Ela também mostrou números. De acordo com o hospital, de 2012 a 2023, foram R$40 milhões de déficit. Somente para a Caixa Econômica Federal, a instituição deve R$17 milhões. Além disso, outros R$55 mil por mês são pagos a parcelas de um endividamento com a Copel. Hoje, com o parcelamento e mais o gasto mensal de luz, são cerca de R$100 mil.

No plano atual de reestruturação da Santa Casa, segundo Bronoski, já há a negociação com médicos e fornecedores. “Também retomamos os salários com isonomia. E trocamos uma empresa de consultoria que nos cobrava R$50 mil por mês, por outra de R$8 mil”, disse. Hoje, segundo ela, a Santa Casa já possui um controle de custos, uma farmácia equilibrada e a possibilidade de um colapso, descartada. Após a sua fala, Bronoski foi muito aplaudida. Com o auditório ficando em pé.

Conselho de saúde

Lenilda de Assis, Presidente do Conselho Municipal de Saúde, revelou que o órgão havia pedido uma intervenção no hospital. No entanto, disse que o pedido não era para mudar a nova direção, mas sim, modificar o modelo de gestão. “A nossa sugestão é para o modelo 100% SUS. Modelo que preza a vida. Sabemos o que estamos defendendo, principalmente, por a Santa Casa ser a única maternidade da cidade. E manter a ala Neo Natal para atender toda a região. Ela também é referência em oncologia. Por isso, defendemos um sistema colegiado de gestores, além de um consórcio entre prefeitos”.

Ciscomcam

Presidente do Ciscomcam, o prefeito de Moreira Sales, Rafael Brito do Prado, reafirmou o compromisso com a instituição. “A Santa Casa não é só de Campo Mourão. Ela é de toda a região. Nunca viramos as costas a ela”, disse. No entanto, fez críticas quanto à falta de comunicação. Assunto que, segundo ele, já está superado. “Tivemos dificuldades em dialogar com a Santa Casa há pouco tempo. Não é uma caça às bruxas, trata-se agora de resolver o problema”, disse.

Campo Mourão

Com a ausência do prefeito Tauillo Tezelli, o coordenador Sergio Henrique dos Santos desejou sucesso à nova diretoria. “Que essas conquistas sejam multiplicadas por mil”, disse. Ele também fez uma espécie de “mea culpa” ao dizer que o município não buscou o diálogo, quando procurou a imprensa, dias após a eleição de Bronoski. Na época, o prefeito teria afirmado que os membros eleitos não teriam “competência administrativa”.

Após o entrave entre prefeitura e Santa Casa, foi a vez do hospital buscar a imprensa para cobrar encargos, supostamente, não pagos pelos cofres municipais. O município então se defendeu mostrando os pagamentos. “Não é feio cobrar, quando se tem a receber. Mais uma vez, o bom diálogo se resolveria”, disse. Sérgio também destacou pagamentos de junho e julho à Santa Casa nos valores de R$815 e R$712 mil à instituição, valores acima do mínimo, de R$550 mil.

“Não existe um confronto entre a prefeitura e a Santa Casa. Isso desestabiliza e dá insegurança a toda população. Colocamos a Secretaria de Saúde e a prefeitura à disposição. Mas é claro, um pedido de intervenção será pedido, se precisar. Isso já era debatido antes mesmo da nova gestão ser eleita. Temos total interesse em resolver a situação”, destacou Sérgio.

Questionamentos

Como a audiência era pública, a população também pode fazer algumas indagações. No entanto, parte dos questionamentos também veio dos vereadores. E o assunto mais abordado foi sobre a ação judicial, com trânsito em julgado, em favor da Santa Casa. Trata-se de valores de R$300 milhões devidos ao hospital pelo Ministério da Saúde.

Consultor da Santa Casa, o advogado Luis Alfredo da Cunha Bernardo confirmou os valores. Mas também explicou que a instituição poderá vender os créditos a fundos de investimentos, captando assim recursos quase que imediatos aos cofres do hospital. E, neste caso, os R$300 milhões serão reduzidos. Sobre o assunto, Bronoski foi questionada em não transparecer o tema com o Conselho e, ainda, acusada por impor uma espécie de autocracia.

Fora o debate, e fora os problemas financeiros, a Santa Casa ainda possui obstáculos a enfrentar, como a renovação ou não, com o Incam, que rege o setor de oncologia. O contrato vence em maio do próximo ano. Em conversas de bastidores, também se ouviu sobre a falta da lavanderia. Se até pouco tempo a Santa Casa mantinha a própria estrutura, hoje, nem máquinas lá existem. Foram retiradas em março deste ano. Para isso, uma empresa de Cascavel foi contratada. Atualmente, toda a rouparia e enxoval do hospital é levado diariamente até a cidade – 180 Km. Segundo informações, o fato está sendo investigado pelo Ministério Público.

Críticas à imprensa

Entre as muitas falas, algumas até, com percepções de vultuosidades de ego, é claro, sobrou à imprensa. Nos entraves dos últimos 67 dias, algumas pessoas deram a entender que toda a confusão envolvendo a instituição se deveu às palavras da mídia. Em tempo, destaca-se que, na falta de diálogo entre município e Santa Casa, a imprensa é quem foi procurada. E não o contrário.