José dormia com o seu maior pesadelo. Mas não sabia
Ainda era cedo quando José viu a companheira Regina adentrar a casa carregando um recém-nascido. Em Araruna, naquela sexta, 13 de fevereiro, ainda perplexo com a cena, ouviu da esposa: “A criança é de uma amiga. Pediu que eu a trouxesse até que ela apanhasse um carro”. Então, compreendendo a situação, ele ajudou com o neném. Inclusive, o carregando no colo, por pouco tempo, a fim de que parasse de chorar. Em toda a sua vida, ele sempre gostou de crianças. Aliás, era um dos seus pedidos junto a Regina. “Ela jurou que iria satisfazer meu sonho de ter um filho”. O que José ainda não sabia é que aquela criança era dele. Um menino. E somente dois dias depois, descobriu que o sonho, apesar de ter sido real, também havia sido destruído. A esposa matou a criança.
José – nome fictício do homem que prefere não ter o nome revelado – sempre foi um trabalhador honesto. Desde os dez, já labutava na roça, em Terra Rica. Ao lado do irmão e da mãe, colhia milho e algodão. Carpia e lidava com a terra, onde derrubava as “lágrimas” de seu suor. E sempre foi assim. Até chegar à cidade, onde passou a atuar na construção civil. À ele, definitivamente, a vida nunca foi gentil. E mesmo nas adversidades, estudou até quando deu, concluindo o segundo grau.
Para assegurar os ensinamentos do colégio, colocou na cabeça um desejo de se tornar padre. Então, aos 13, acabou em um seminário de Paranavaí. Cristão até hoje, permaneceu lá por seis anos. Mas abandonou a possível “batina” aos 19, após ser tomado por desejos materiais. “Eu queria ter minhas coisas. Também queria me relacionar. Então optei por caminhar numa vida diferente daquela”, lembrou.
Ao deixar o seminário, encontrou uma moça, por quem se apaixonou. E com ela teve um filho, hoje com 20 anos. Aliás, um marmanjo, maior que o pai. A duração do relacionamento foi muito rápida. Pai e filho sempre estiveram juntos. Enquanto ela, distante. Muito possivelmente, um retrato do seu próprio passado. José nunca conheceu o pai.
Conta que teve o primeiro contato com a companheira há quase dois anos. Regina apareceu na tela do seu celular através de uma rede social. A partir dali iniciaram longas prosas. Até que a vontade em se conhecerem surgiu. O papo foi reto. E numa atração sem precedentes, juntaram os trapos. Ao todo, um ano e meio de uma excelente relação. Até chegar o dia 15 de fevereiro, quando conselho tutelar e polícia militar entraram em cena.
Naquele dia, os conselheiros apareceram na casa para verificar como o bebê estava. Mas para surpresa deles, não havia bebê. Regina também não estava na residência. Havia ido trabalhar, como sempre fez. Quem estava era José. E inocentemente, sem nada saber, esclareceu que a criança havia sido entregue à mãe verdadeira, como narrado por Regina. A partir daí, percebeu que o mundo em que vivia, parecia mais a um filme de terror. Ele foi enganado de todas as maneiras possíveis.
José foi comunicado pelos conselheiros que o bebê era de Regina. E que ela havia dado à luz dias antes, no hospital de Araruna. “Então em choque, eu liguei no celular dela. Ela veio do trabalho para casa e lá, acabou confessando a gravidez e o que fez com o nenê. Ou seja, eu estava morando com um monstro. Achei que a conhecesse”, disse.
José afirma que jamais desconfiou da gravidez da mulher. Ele mostrou um vídeo dela, três dias antes de dar à luz. Era uma pequena confraternização em família. A imagem não evidencia uma possível gravidez. Ainda mais de quase nove meses. “Eu tenho mais barriga que ela”, disse. Segundo ele, por não conseguir identificar a gestação, passou a ser “condenado” pela imprensa e pela sociedade.
No dia em que soube de toda a verdade, através da confissão da esposa, José também foi levado à delegacia de Polícia Civil, em Campo Mourão. Lá, teve o celular apreendido e prestou depoimento. Mas saiu em liberdade, principalmente, por ficar claro não ter participado da morte da criança. Aliás, de seu próprio filho, como foi informado por Regina. “Mostraram meu rosto na televisão. E quadricularam o dela. Passei a ser acusado por algo que nunca fiz. Sou inocente. Eu realmente não sabia da gravidez e, posteriormente, do que ela fez”, disse.
José conta que Regina era uma pessoa aparentemente normal. Contava piadas, tomava uma cerveja. Juntos, saíam e se divertiam. A relação era tão prazerosa que, por muitas vezes, acreditava ter encontrado a mulher de uma vida inteira. “Ela ia à igreja todo final de semana. Falava em Deus. Não dá para acreditar no lado sombrio que ela tem. Passei a não ter mais nenhum sentimento por ela. Quero esquecer tudo o que passei ao seu lado”, disse.
No entanto, segundo ele, as coisas poderiam ter sido diferentes. Ele ainda questiona porque o hospital municipal, onde ela teve a criança, não o procurou. “Eles têm o meu nome no cadastro. Por que não me ligaram”, questionou. Procurada, a Secretaria de Saúde de Araruna informou que o hospital não procurou José porque, quando Regina foi questionada sobre ele, a mesma teria informado não ter mais marido. “Que estava separada dele e não sabia onde se encontrava. Porém, o filho foi comunicado. E fez visita para ela no hospital”, informou o secretário de Saúde Márcio José dos Anjos Bizao. Para a secretaria, além dela esconder a gravidez do próprio marido, também mentiu a relação sobre ele.
Após descobrir toda a teia cruel desenvolvida pela ex-companheira, José se encarcerou na casa da mãe. Lá permaneceu 60 dias sem sair. Segundo ele, estava com medo. Medo de virar uma espécie de caça pela sociedade, já que muita gente o condenou antes do tempo. “Sempre fui inocente. Jamais imaginei que ela poderia fazer algo do tipo. Acabei segurando a criança em meus braços. Se soubesse da gravidez dela, poderia ter evitado o que ela fez. Mas infelizmente, não há mais o que fazer. Ela destruiu a minha vida”, disse.
Regina
Presa ainda em 15 de fevereiro deste ano, Regina confessou à polícia não somente a autoria deste infanticídio, mas também outros dois, em 2013 e 2016. Após ser encarcerada em Campo Mourão, acabou transferida à Goioerê. Lá, após apresentar problemas de saúde – trombose na veia femoral – foi solta em 6 de abril, ficando em prisão domiciliar. Mas voltou a ser presa três dias depois, em 9 de abril.
De acordo com o advogado dela, Pedro Ricardo Camargo, a defesa ainda não tem certeza absoluta que a cliente matou as duas outras crianças. “A família relatou que ela pode ter doado os filhos”, disse. Sobre o ex-companheiro, José, Pedro afirma que ele nada sabia sobre a gravidez. Mas garantiu que o filho assassinado por Regina, era mesmo dele. Em tempo: José não tem certeza que a criança era sua. Regina segue presa.