A tragédia pessoal de Patrícia
Hermínia, mãe de coração, há tempos já aconselhava Patrícia a deixar a casa do sogro, Valdir. Eram muitos conflitos. Brigas banais. Discussões por nada. Mas na última semana, as previsões se confirmaram. A menina de 16 anos foi brutalmente assassinada. Ela estava em casa, na Rua dos Encontros. Nome bastante sugestivo ao prenúncio da tragédia que poderia acontecer. E aconteceu. Naquela tarde, Valdir chegou da rua. Uma discussão acalorada iniciou. Descontrolado, apanhou um facão e, pelo que tudo indica, a matou em frente à filha dela. Mesmo com dois anos, a criança correu a uma vizinha pedir ajuda. Tinha no corpinho respingos de sangue da própria mãe. O socorro era em vão. Patrícia já estava morta. E, Valdir, havia fugido. Teve a alma condenada e desapareceu no mundo.
Patrícia Kauane Santos de Mello, era uma menina sonhadora. Engravidou aos 14 anos no interior de São Paulo. Morava com a mãe biológica. Mas a gravidez não foi compreendida pela genitora. Contam familiares que foi “convidada” a deixar a casa. Então, voltou a Campo Mourão. Morando com o pai, teve ajuda, apoio e carinho. Aos 15, a filha nasceu. Meses depois, já havia encontrado Diogo. Seu companheiro e pai adotivo da criança. “Ele era muito bom para ela e para a criança”, conta Hermínia Camargo dos Santos – que entrará na história logo mais.
A moça passou a morar sob o teto de Valdir Mendes Gomes, 48, pai de Diogo. Ele tem uma residência no Jardim Tropical 2, em Campo Mourão. Era ali onde Patrícia, o esposo e a filha, ocupavam um dos quartos. Contam mais próximos que ela não se dava com o sogro. Quase todos os dias, uma briga. Na última semana, Patrícia lavava roupas. Era fim de tarde. Ao seu lado, a filha, que brincava sem roupinhas. E a cunhada, Andriele. Conversavam quando Valdir chegou. Sem motivo algum, a briga teve início.
“Ele disse a ela que não precisava dela. Ela devolveu e disse também não precisar dele”, revelou Andriele. Para ela, foi uma discussão à toa. Sem motivos aparentes. Mas que passou a ficar sem controle. Bastante nervoso, Valdir apanhou um facão e a atacou. Patrícia, segundo a polícia, havia apanhado um machado para se defender. Mesmo assim, ela teve braços e pernas cortadas. O sangue atingiu até a filha, que correu assustada. Patrícia também tentou escapar. Mas foi alcançada ainda no quintal, e derrubada. Impiedosamente, o homem terminou o que havia começado. Com um dos pés sobre o seu corpo, a golpeou, agora, no pescoço. Consciente do que fez, levou o facão e sumiu numa boca de mato próxima a casa. Nunca mais foi visto. A polícia o considera como um foragido.
Assustada, a filha de dois anos correu até a vizinha e clamou ajuda. “Ela chegou tremendo. Tinha sangue no corpo. Estava nua. Disse que o seu vô estava matando a sua mamãe”, revelou a senhora. A menina foi assistida pelo Conselho Tutelar. E está interna em um lar provisório. Em breve, deve retornar aos familiares.
Hermínia entrou na história de Patrícia há alguns anos. Ela se casou com o pai da adolescente, ainda quando ela era um bebê. Então, o novo casal passou a criá-la. “Ela era como se fosse minha filha de sangue. Eu a criei com muito carinho e amor. Era minha menininha”, disse. A mãe de coração explica que a vida de Patrícia nunca foi fácil. Tinha o sonho de ter a própria casa, ao lado do companheiro e da filha. Mas, enquanto não conseguia, se submeteu ao teto do sogro. E isso, a afligia demais.
“Ela sempre reclamava do sogro. Dizia que ele pedia que ela deixasse a casa. Jogava na cara dela que ali não era a sua residência”, conta Hermínia. Então os conselhos eram para que saísse do local. E se afastasse do homem. “Aconselhamos ela diversas vezes. Minha outra filha disse a ela: Saia de lá antes que esse cara mate você”. E Patrícia a ouviu.
Alguns meses antes da tragédia, cansada dos conflitos, Patrícia apanhou a filha e suas coisas e deixou a casa. Diogo foi junto. Alugaram uma casa por apenas dois meses. Mas, como a grana era curta, decidiram retornar sob o teto de Valdir. Lá, as brigas com o sogro continuaram. Um dia, deixou o local e o próprio companheiro. Disse ir embora ao interior de São Paulo. Não queria mais conflitos em sua vida. Antes, ficou na casa de Hermínia. Em seguida, buscou o colo do pai. Bem no fim, acabou reatando com Diogo. E acabaram voltando a Rua dos Encontros. Local onde teria, efetivamente, um “encontro” com a morte.
Hermínia está chocada com o que aconteceu. Emocionada, chorou por algumas vezes durante a entrevista. “É muito triste você criar uma pessoa com tanto amor. E depois ver um homem tirar sua vida como ele fez”, disse. Para ela, Patrícia era uma pessoa maravilhosa. Cheia de sonhos. Era estudiosa e sempre buscou a Deus. A moça também batalhava ao lado de Diogo. Por inúmeras vezes deixou a filha para fazer jardinagens com o companheiro. Diogo foi procurado pela reportagem, mas não foi encontrado.
Recentemente, Diogo passou a trabalhar na construção civil. Então, coube a companheira ficar em casa, ajudar nas tarefas do lar. Mas a ideia não foi tão boa. Os conflitos com Valdir só aumentaram. “Patrícia me dizia que o sogro a chamava de vagabunda. Dizia não ser mulher ao filho dele. Isso mexia muito com ela”, lembra Hermínia.
Bem no fim, todos os conselhos dados a moça, não foram ouvidos ao pé da letra. Ela não voltará. E o sonho em reatar a convivência com a mãe biológica, em perdoá-la pelo que passou, também ficou ao vento. “Patrícia dizia que queria voltar a ser amiga de sua mãe. Deixar pra trás as coisas que aconteceram”, lembrou a cunhada. Mas não houve tempo para isso. Agora, o que restou aos familiares, é a justiça. E eles clamam por isso.
Valdir
Valdir, segundo a nora Andriele, não bebia. Até então, era tido como um homem batalhador. Carpia uma roça aqui. Outra ali. Regularmente, vendia verduras pela rua. Era o típico brasileiro que recebia hoje, pra comer amanhã. Pelo que se sabe, não tinha histórico nas fichas criminais da polícia. No entanto, tinha sim, temperamento explosivo. Nem sempre, é verdade. Mas o nervosismo era habitual.
A família vem de tragédias na década de 90. Um irmão de Valdir tinha 19 anos quando foi preso, em 1998. Na época, confessou ter matado o próprio pai, Olivério Trizote Gomes, 64, em 13 de maio de 1998. O pai morreu pela manhã, quando tirava leite das vacas de sua chácara, também no Jardim Tropical 2. Levou um tiro no braço, várias pauladas na cabeça e facadas diversas pelo corpo. Como no caso de Patrícia, um crime familiar. Brutal. E sem vestígios de piedade.
Na ocasião, revelou ter matado o pai porque ele era muito ruim aos filhos. O irmão também desconfiava que sua mãe, Geraldina Mendes Gomes, tinha sido morta por seu pai. O fato aconteceu em setembro de 1997. A reportagem não obteve dados sobre o caso.
Anos mais tarde, em 2012, o mesmo irmão, aos 33 anos, foi morto no portão da sua residência, também em Campo Mourão. O crime aconteceu na manhã de um domingo. Ele tomava café com a família, quando duas pessoas, em uma motocicleta, chegaram ao portão e o chamaram. Ao atender, foi surpreendido por um dos motociclistas, que efetuou vários disparos contra o seu corpo. Os tiros foram a queima roupa e atingiram o rosto, tórax, abdômen e o braço. No corpo foram identificadas sete perfurações.