Bruno quase vendeu a alma ao diabo
Desde cedo, Bruno foi incentivado pela mãe e avó, a frequentar os bancos da igreja. Aos 11 anos, já cantava e dedilhava o violão. Colaborava nos cultos evangélicos. Era um menino tranquilo. Sorridente. Mas bastou chegar aos 14, pra vida mostrar suas armadilhas. Passou a ter amizades. Não tão saudáveis. Conheceu a maconha. Ingeriu álcool e, com o tempo, se afundou no crack. Para conseguir o entorpecente, vendeu tudo o que tinha. Não restando nada mais a ser vendido, quase negociou a alma ao diabo.
Também conhecido como “Bruno Neguinho”, fumou crack pela primeira vez ainda aos 17 anos. A droga foi apresentada por um colega – morto há dois anos por dívidas com o tráfico. O conhecido se foi. Ficou o vício. E ele nunca mais parou. Na trajetória doentia, deixou de trabalhar e passou a vender o pouco que tinha. “Primeiro vendi minhas coisas. Tênis, roupas. Depois, passei a vender coisas da minha mãe. Até roupas dela”, disse.
Bruno havia perdido o controle de si mesmo. Algumas vezes, traficantes faziam chacota dele. Afinal, surgia na “boca” com roupas da própria mãe. Elas não tinham valor algum ao tráfico. “Eu saía humilhado de lá. Eles diziam pra eu sumir”, lembrou. Perto dos 19 anos, a mãe o levou para mais de oito abrigos. Todos, com o intuito de afastá-lo das drogas. Nada funcionou. A última tentativa aconteceu na Comunidade Salvando Vidas. Lá, ele foi recebido pelo pastor Adão. “Cara, eu cheguei lá e vi o pastor de bermudas. Chinelo. Pensei: é aqui que vou usar mais droga. O cara deve ser doido também”, disse.
Ele pensou errado. O pastor em questão, jamais usou terno e gravata. Pelo menos, no abrigo criado por ele. Ali, a causa era outra. Salvar vidas, definitivamente, não dependia de roupas sociais. Na Casa do pastor, Bruno permaneceu onze longos meses. Foi o suficiente para que a ficha caísse. Ali, aprendeu os caminhos a percorrer, se distanciando das drogas. E, o pastor, a bem da verdade, foi bem mais que um pastor. Possivelmente, o pai que não teve.
Recuperado, Bruno deixou o abrigo e decidiu virar homem. Arrumou emprego. Casou e teve um filho. Tudo ia bem. Mas em 2018, veio a notícia que a companheira estava, mais uma vez, grávida. O ultrassom revelava: eram duas meninas. No entanto, nem tudo era bom. O exame mostrou se tratar de gêmeas siamesas. Estavam unidas pelo tórax e dividiam um único coração. A revelação caiu como uma bomba. Preocupados, os pais buscaram especialistas no país. Até mesmo, foram orientados a um aborto legal. Diziam que os bebês não sobreviveriam. Mas o casal pagou pra ver. Queriam as meninas e foram até o final.
Em Curitiba, o parto foi realizado. Mas, como já se esperava, as meninas não sobreviveram. Bruno foi ao abismo. Em estado emocional acima do próprio limite, abandonou a esposa. E se entregou ao crack, mais uma vez. Agora, morava nas ruas da capital. Tornou-se um invisível. Não trocava de roupas. Não tomava banho. Dormia em valetas na área central, onde corria um rio. De dia pedia esmolas. Mentia que eram para comer. Mas o objetivo, mesmo, era se alimentar do crack.
Bruno se tornou um escravo de si mesmo. Não via mais o fim do túnel. E seu mundo era agora, um abismo infinito. A cada dia, mais se afundava. Andando pelas ruas de Curitiba, eis que um sujeito bem alinhado, num carrão, para ao seu lado e o chama. “Você tem uma luz própria. Um brilho. Posso dar o que você quiser”, disse a ele. Mas Bruno desconfiou. Não aceitou. E saiu de cena. “Não sei quem era. Mas, minha alma não venderei ao diabo”, disse.
Seis meses se passaram. Seis meses na rua. Seis meses no crack. Bruno não tinha mais ninguém. Pelo menos, assim ele pensava. Um dia, drogado, caído sob uma lona, na periferia da capital, sua mãe o encontrou. E o carregou de volta. Ela havia deixado Campo Mourão. Residia em Itapema, Santa Catarina.
Lá, Bruno não parou com a droga. Mas diminuiu. Arrumou trabalho e a vida melhorou. Tanto é que voltou a se aproximar da ex-mulher. Fez um convite, e ela aceitou se mudar para lá. Junto ao filho, o casal passou a ganhar dinheiro. Ele faturava R$2 mil na construção civil. Ela, R$1,8 numa padaria. Mesmo assim, Bruno não deixou o vício. E passava dias distante da casa. A situação revoltava a companheira. Um dia, ele chegou. Não havia mais ninguém. A relação tinha terminado.
Em 2018, Bruno e a mãe, retornaram a Campo Mourão. Ele não se redimiu. As drogas continuaram em seu caminho. Mais e mais. Não teve jeito. Numa de suas noitadas, se meteu com quem não devia. Despejaram um tambor de 38 em sua direção. “Ouvia o zumbido daqueles disparos. Mas nenhum me acertou. Quer saber, pra mim chega. Preciso de ajuda”, disse.
Então, em novembro de 2020, Bruno recarregou as esperanças e rumou sentido ao abrigo da Comunidade Salvando Vidas. Mais uma vez, foi recebido pelo velho amigo, pastor Adão. Ele já está há quase três meses sem a droga e sem o álcool. Mas tem certeza do que deseja: se libertar. Agora, de uma vez por todas. As saídas estão próximas. O difícil, são encontrá-las.