Mortos que vivem

Não existe vida após a morte, e sim morte após a vida

Robson Santos

            De uns tempos… de lá pra cá, mortos foram lembrados por mim. Nada fiz efetivamente para trazê-los à tona à memória. Sem invocá-los para aparição, não significa ignorar e desmerecê-los. 

            O desejo meu é deixá-los todos em paz, não pedir-lhes nada. Creio me caber agradecê-los pelo que continuam a representar, saudar é enaltecê-los, faço alusões ao importante legado, reminiscências marcadamente inesquecíveis, muitas fui testemunha ou alvo.

            O vazio preenchido em nossas existências, longas, efêmeras, nos convencem o quanto a falta  deles é sentida, inevitável saudade, nada foi em vão.

            Retomo ao início do texto, o motivo para ultimamente lembrar dos mortos se relaciona com  imagens física deles, estavam em cenários nos quais eu fui espectador, quem sabe também casual. 

            Confesso nunca ter sido tomado pelo medo, sensação que se tiver ocorrido, não me recordo.

            As lembranças são instigantes, decifráveis ou enigmas?

            Ao andar bem cedo, os raios solares eram poucos e tênues, numa das avenidas mourãenses eu vi um senhor que caminhava trajando roupas como quem ia para o trabalho ou estava no  retorno para casa. Ao longe a sensação era que eu iria me encontrar com o meu saudoso pai. Cada passo – o dele e o meu – encurtava a distância, assim como fora intensa minha emoção. Quando a proximidade chegaria a ser ínfima, aquele homem vira na esquina e desce pela rua. Quando  chego na esquina o vi a caminhar com os mãos para trás, hábito do seu Eloy Maciel, em meio a bruma desapareceu, pelo menos ao alcance de meu olhar. Não afasto a razão primeira de tratar-se de alguém meramente parecido, mas tal conclusão preliminar não satisfaz. Noutra ocasião, na fila do caixa de um supermercado, vi um homem a apanhar compras, senhor que fez-me lembrar do saudoso advogado Paulo Ribas, meu dileto amigo, melhor dizendo, não me fez lembrar, era ele, gestos principalmente com as mãos, a voz e o andar quando de lá se retirava educadamente se despedindo, simpaticamente, era ele sim. Ergui minha cabeça procurando avistá-lo melhor, sem êxito.   

            Recentemente, ouvi o som do arrastar dos pés do meu saudoso irmão Eloy Maciel Filho. Era típico dele determinados sons por ser surdo e mudo, tinha peculiaridades que certamente produzia sem a percepção de ouvi-los na mesma intensidade da audição normal. Eu no dia 20 e ele no dia 21 de abril, algumas vezes comemoramos juntos nossos aniversários, era uma festa só. Daí vem a recordação perenemente intensa quando se aproxima e chega tal data. Mas não estou confundido a recordação como quem não percebe ser então fruto de devaneios pela saudade do irmão sempre querido. Não. O som dele a caminhar rompia o silêncio da madrugada, eu tinha acabado de deitar e imediatamente levantei e fui até a porta para abri-la sem medo ou receio : Só vi o corredor do prédio escuro, deserto. Dirão que eu devia estar sonhando, literalmente ou não. Questionei o interior da minha consciência. Deitado, olhei para saber que horas eram, 2:10. Ao escutar os passos arrastados que levaram a levantar, novamente olhei para o relógio, ele marcava precisamente 2:12 horas.

            Mortos jamais me incomodaram, só desejo que vivam em paz. Sem me achar  impressionado, a fé que tenho não conflita com a materialidade. Se pessoas tem dons como a mediunidade, eu sou o mais cabal exemplo de não abrigar essa condição nem passageiramente. Respeito quem tem.

            Qual o significado de tudo? Por mais que reflita não sou capaz de nenhuma conclusão. Me preocupa se mortos pretendam algo e tenham me escolhido como mensageiro. Qual a mensagem? Devo levá-la para quem? É para mim? 

            E se for um chamado?  

Fases de Fazer Frases (I)

            Não dê ouvidos. Apenas empreste-os, se preciso. 

Fases de Fazer Frases (II)

            Atiro o que tiro e me retiro. Me retiro com o tiro que não retiro.  

Olhos, Vistos do Cotidiano

            Atendo ao telefone. Silêncio. Pausa. Respondo silenciando sem desligar, como o misterioso interlocutor. Silêncio de ambos… ensurdecedor. 

Reminiscências em Preto e Branco

            Pensar, sentir, agir, produtos da imaginação, raros. Minha mercadoria está barata, em liquidação. Terá procura?