O botão-extra
Abotoo o botão da bota.
Boto a bota desbotada.
Sem ver piso na rosa em botão.
Tiro a bota que botei
Estive Nólocal (b.d.C.)
De tanto eu usar, ela usada ficou. Está muito boa. A bermuda me serviu por muito tempo. Resolvo separar a peça para doar. Mas tenho que me despedir dela.
Ainda assim não queria experimentar a sensação de se desfazer dela por desprezo. Cá com meus botões, fiquei a pensar numa desculpa como por força maior. Encontrei, melhor dizendo, a justificativa. Tinha ido ao mercado num desses sábados para só fazer uma comprinha. Peguei uma cestinha. Durante a compra, tinha frequentemente que parar e puxar a bermuda, que ia descendo à medida que fazia o périplo às prateleiras. Uma mão que segurava a cestinha, outra a puxar a bermuda à altura da cintura. Estava larga aquela bermuda.
Como eu tenho uma sacola para colocar roupas que não usarei mais, pouco antes de pôr a bermuda, vejo o botão-extra. O longo tempo de uso não afetou os três botões titulares. A marca tão boa que veio um botão-extra. Botão-extra nunca usado, como pneu estepe (sobressalente, como gostava de dizer o meu saudoso pai Eloy).
Evidentemente quando comprei a bermuda nem me dei conta do botão-extra. Assim como não prestei atenção noutros botões-extras de peças como camisas e calças. Que grande vantagem não precisar comprar outro botão, achar um igual, ter todo esse trabalho. O extra está ali, à mão.
Nunca precisei usar botões-extras. É certo que ao comprar roupa não lembrarei desse botão. Muito menos só comprar uma roupa se tiver um botão extra.
Assim como botão-extra cairá no esquecimento, o texto de hoje, caro leitor, também será rapidamente esquecido.
Sem utilidade. Claro, inúteis só o botão-extra, o texto e o escrevinhador aqui.
Fases de Fazer Frases (I)
Fujo do tempo fungível.
Finjo ser fungível a tempo.
Há tempo finjo fugir.
Fulgir a tempo de fingir.
Foge de mim o tempo que funge.
Forja-me o tempo fingido, fungível, fugidio.
Fases de Fazer Frases (II)
Quem não larga a vida tem uma vida segura.
Fases de Fazer Frases (III)
A indiferença é o tênue do esquecimento.
Olhos, Vistos do Cotidiano (I)
Medidas cabíveis. Textos lidos, pronunciados ou escritos, principalmente nas notícias policiais, repórteres, jornalistas usam muito tal jargão. Não é preciso citar algum exemplo. O medidas cabíveis é figurinha fácil.
Bastaria terminar a narração (radiofônica, televisiva) ou o texto impresso sem mais nada dizer, escrever. Policiais prenderam os assaltantes ainda no banco. E ponto final. É dispensável dizer que eles seriam conduzidos à delegacia (qual seria o outro lugar?) para: medidas cabíveis. O medidas por vezes é substituída por outra expressão, providências.
Olhos, Vistos do Cotidiano (II)
Como de hábito, ao caminhar a pé pela cidade, um mourãoense conversa em voz alta (provavelmente com um vizinho dele) o suficiente para eu escutar facilmente. Nenhum governo ou político presta. A questão nem é pela generalização, me chamou a atenção a calçada da casa dele, repleta de pedaços se soltando e sem uma árvore plantada. Bem, tem que possa achar – além dele – que deverá o político ou governo quem deve plantar, regar a árvore e arrumar a calçada. Acrescento, mais alguém para dar descarga da privada dele.
Reminiscências em Preto e Branco
Maior preocupação não deveria ser a extinção do jornal ou livro impresso, mas sim o desaparecimento dos leitores. A sensação é que leitores vão morrendo sem que nasçam outros.
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Por José Eugênio Maciel | [email protected]