Os 90 anos de Thiago e Cony

Cony está fazendo 90 anos. Sua seiva continua viva e ele ainda me faz a cabeça

Ruy Castro, jornalista e escritor

Eles chegam aos 90 anos com a disposição dos moços e a intensa paixão pelas palavras. Reafirmam que a criação literária não é parte da vida deles, é a vida dos dois justaposta nos que   apreciam textos ricos, diversos, fecundantes.

Carlos Heitor Cony, carioca nascido em 14 de março de 1926, romancista, contista e cronista. Na Folha de São Paulo escreve desde os anos 60 figurando entre os mais lidos do Jornal. Graças às crônicas que o conheci levando-me a ler os romances, melhor é o Quase Memória, (1995), recordações do autor a respeito do pai morto aparecido para o filho em sonho. A Folha destacou o aniversário: Cony, 90, cabeça a mil. Apesar dos problemas com a falta de saúde, o escritor prepara o 20º livro e não quer parar de escrever. Nas crônicas mescla erudição e simplicidade com doses de pessimismo geral. Perseguido pela ditadura militar não se curvou nem  abriu mão de se expressar livremente com conteúdo, lição de história, análise, experiências culturais que o puseram entre os literatos mais influentes da geração dele e nas demais recentes. Avesso à homenagens, retrucou a Academia Brasileira de Letras  por parabenizá-lo pelos 90 anos.

Também perseguido pela ditadura militar brasileira, Amadeu Thiago de Mello chega aos 90 neste mês, dia 30. Amazonense da pequena Barreirinha é poeta que bem representa autenticamente a melhor poesia do Brasil. Diplomata de carreira e tradutor, Thiago de Mello estava no Chile quando foi dado o golpe militar. Precisamente naquele 1964, (abril, em Santiago) ele escreve o poema magnífico que o tornou ainda mais célebre Os Estatutos do Homem (trechos transcritos a seguir) é obra literária verdadeira elegia humanística. Registro novamente a demora dos membros da Academia Brasileira de Letras que ainda não escolheram Thiago para dela faz parte, embora há muito já imortal:  

Os Estatutos do Homem
Artigo I: Fica decretado que agora vale a verdade. /agora vale a vida, /e de mãos dadas,/ marcharemos todos pela vida verdadeira. (…).
Artigo III: Fica decretado que, a partir deste instante, /haverá girassóis em todas as janelas,/
que os girassóis terão direito/a abrir-se dentro da sombra;/e que as janelas devem permanecer,/

o dia inteiro, /abertas para o verde onde cresce a esperança. (…).
Artigo IV: Fica decretado que o homem não precisará nunca mais duvidar do homem./ Que o homem confiará no homem/ como a palmeira confia no vento,/ como o vento confia no ar,/

como o ar no campo azul do céu. (…)
Parágrafo único: O homem, confiará no homem/ como um menino confia em outro menino.
(…)
Artigo V: Fica decretado que os homens estão livres do jugo da mentira./Nunca mais será preciso/ usar a couraça do silêncio/ nem a armadura de palavras./ O homem se sentará à mesa com seu/ olhar limpo porque a verdade passará a ser servida/ antes da sobremesa. (…).
Artigo VIII: Fica decretado que a maior dor/ sempre foi e será sempre não poder dar-se amor a/ quem se ama/ e saber que é a água/ que dá à planta o milagre da flor.
(…)
Parágrafo único
: Só uma coisa fica proibida: amar sem amor.
Artigo XIII: Fica decretado que o dinheiro não poderá nunca mais comprar o sol das manhãs  vindouras./ Expulso do grande baú do medo, o dinheiro se transformará em uma espada fraternal
para defender o direito de cantar e a festa do dia que chegou.
Artigo Final
: Fica proibido o uso da palavra liberdade,a qual será suprimida dos dicionários e do pântano enganoso das bocas./ A partir deste instante a liberdade será algo vivo e transparente/ como um fogo ou um rio,/ e a sua morada será sempre o coração do homem.

Fases de Fazer Frases (I)

Aves não gostam do ditado, não vale a pena.

Fases de Fazer Frases (II)

Nem sempre que gosta de alcovitar, gosta da alcova. 

Olhos, Vistos do Cotidiano

Jornalista talentoso desta Tribuna, Walter Pereira sabe retratar fatos com imagens que correspondem nitidamente os acontecimentos, como a foto que ilustrou a manchete na edição da quarta, a safra agrícola: uma colheitadeira em operação, e no segundo plano a vista urbana de Campo Mourão. Belíssima!

Reminiscências em Preto e Branco

Outono… tudo é novo em folha… mesmo quando ela seca e cai.