O Lula, o mastro e o leme da economia brasileira
Podemos fazer uma analogia: o navio representa a economia de um país; o leme, a política monetária que o direciona; e o mastro, a política fiscal, que dá sustentação a qualquer movimento da embarcação. Imagine um barco a vela, em um local onde o vento sopra. A vela, presa ao mastro, coloca o barco em movimento. E, então, o capitão utiliza o leme para direcionar o barco. O que tem essa alegoria a ver com a economia do Brasil e, mais diretamente, com as críticas que o Banco Central tem sofrido, vocalizadas pelo presidente Lula, em relação à condução da política monetária?
Primeiramente, é preciso dizer que esse tipo de ataque ao Banco Central é mais comum em países onde a irresponsabilidade fiscal ocorre. Poderia utilizar como exemplo a Argentina, mas o último que retratou esse problema de forma mais contundente foi a Turquia, onde o presidente, Recep Tayyip Erdogan, demitiu o chefe do banco central turco, Naci Agbal, em março de 2021, substituindo-o por Şahap Kavcıoğlu. Coincidência: Kavcıoğlu é um crítico das altas taxas de juros, assim como Erdogan.
A partir dessa mudança, o novo presidente do BC turco baixou os juros, e essa atitude resultou inerte. O ambiente econômico turco em poucos meses se tornou caótico – em outubro de 2022, a inflação já estava acima de 80% e sua moeda caía mais de 30%. Por quê?
Porque a política monetária é o leme, e não o mastro, e, infelizmente, este segundo foi quebrado. Logo, não importava para onde o leme seria direcionado, a única certeza é que não se teria controle sobre nada naquele país, gerando problemas enormes, como um navio sem mastro em uma tempestade.
Essa cena se repete, em menor proporção, aqui no Brasil, com as críticas de Lula ao presidente do BC, Roberto Campos Neto, afirmando que o comandante do banco estaria mantendo a Selic mais alta do que deveria por questões políticas – isto é, por ter sido nomeado no governo de Jair Bolsonaro, adversário do atual presidente da República, Campos Neto estaria sabotando o país. Soma-se a isso o repúdio de Lula à independência do Banco Central, em função de o indicado sempre intercalar dois anos em diferentes mandatos presidenciais.
Para entender a crítica sobre os juros e a decisão de elevar ou reduzir a Selic, é válido voltar ao conceito de política monetária: “A política monetária é um conjunto de medidas tomadas por governos, geralmente através de seus bancos centrais, com o objetivo de influenciar a quantidade de dinheiro em circulação na economia”. Essa medida se dá principalmente com o uso de instrumentos como a taxa de juros, as operações no mercado aberto e o controle das reservas internacionais.
Há uma confusão clara aqui. Muitos pensam que a política monetária é a principal responsável por controlar a inflação e a atividade. No entanto, ela é apenas uma consequência; ela é reativa, e há um trabalho técnico de colocar os juros conforme os índices de inflação e câmbio aparecem. Assim, logo há o questionamento: o que primeiramente afeta inflação e câmbio?
A resposta é simples: a política fiscal. O governo, ao gastar mais do que arrecada, gera inflação, descontrole de câmbio, entre outros problemas que podem ser levemente atenuados pela política monetária. No entanto, é muito mais fácil criticar uma condução monetária do que criticar corte de gastos e buscar uma política superavitária. Quando não se segue uma política fiscal minimamente responsável, o monetário de nada serve, a não ser para alimentar discursos políticos sem profundidade.
Caio Hexsel Abichequer, sócio da Auroque Investimentos e associado do Instituto de Estudos Empresariais (IEE).